13 de nov. de 2014

Não é mais uma história de amor





Aquela esquina era claramente marcada para não ser mais uma história de amor. E não é uma história qualquer, muito menos, de amor. Tudo se refez conforme os contos de Lispector. Tudo havia se desfeito conforme os contos de Caio Fernando Abreu. Tudo havia se tornado conto. Até mesmo aqueles dois.

Ela olhou para ele com muito sono. Já não era mais amor, nem tesão, nem era ao menos loucura infiltrada como antes. Ela olhou para ele e para tudo aquilo em volta com muito sono. Não havia mais motivo para continuar, e nem desistir. Já não tinha mais motivo algum para procurar o nada, nem ao menos, procurar o que foi perdido há tempos. Já não havia motivo para procurar o cheiro dele em outros corpos, e nem em outros gestos. Já não havia motivo para chorar, descabelar ou enlouquecer. Já não havia motivo nem ao menos para dizer que tudo havia acabado. Na verdade, ele que era o motivo de tudo já não existia mais, e assim, chegaram ao fim.

Meados de aquele tempo em que só chove. Não há sol nem ao menos para dizer que o caminho está sendo iluminado. Não há claridade alguma para dizer que encontrou alguma resposta. Ela suspirou pela milésima vez, como se estivesse parindo alguma coisa, e tenho certeza que ali nasceu a saudade pela primeira vez. Ali, aquele parto em forma de suspiros, nasceu a saudade. Ela suspirava tanto, tanto, e tudo isso era para segurar o choro. Mal sabia ele os caminhos que ela andara. Mal sabia que ela estava disposta a entrar num mundo que nunca foi dela para ver se ao menos, tudo acabava.

Ela, cheia de si, estava lá, parada esperando que o mundo resolvesse dar uma resposta. Ela, cheia de respostas incompletas e cheia de reticências, estava parada naquela esquina, com um cigarro na mão, esperando que tudo se resolvesse. Mas como vai resolver algo que não teve nem início? Pois bem, ninguém sabe. Só sabia que doía sem parar naquelas noites vazias e silenciosas. Aquelas noites que vagava sem rumo, sem respostas, e até mesmo sem coração.

Até que um dia, ela o viu. Ele estava sendo feliz conforme ela se lembrava. Aquele olhar distante se transformou numa mágoa. E ela, que nunca havia sentido ódio de ninguém, estava tomada de amor, loucura e ódio por ele. Ele, que havia salvado seu mundo diversas vezes. Ele, que havia buscado tanta profundeza em sua alma. Hoje já não significa nem ao menos um motivo coerente para ela buscar as respostas. O ano está acabando, dizia ela. O ano está acabando, e eu também, então, por favor, me salva. Ela só tinha ele. Só ele com ela. Ela com ele. Ele comigo.

Ela não era ridícula. Não mesmo. Seu olhar havia malícia misturada com mistérios, e sabe-se lá o que isso quer dizer. Seu olhar que era meigo, havia se tornado um poço de solidão, de mágoa, e composto de álcool e de drogas. Ela se perdeu de você, de mim, e do mundo. Ela apenas não acreditava mais em nada. Nem signos, nem anjos, muito menos nos demônios. Ele se perdeu também, mas isso não vem ao caso. Ele que se perdeu, ele que se encontre. Estamos aqui para falar dela, da menina, da mulher, e do monstro que ela virou.

Todos se lembram daquela menina sorrindo, aliás, ela tinha um sorriso muito bonito, e era o que todos diziam. Atrás dele, havia outros, havia uma lista enorme de misteriosos homens querendo descobrir o que ela tinha atrás de tudo aquilo. E ela, fechada em seu próprio ego, apenas suspirava e gemia. Era um segundo parto, e esse parto nasceu a solidão. Suspirava com força como se algo fosse sair novamente. Suspirava com mais força para não chorar, e aos poucos, esse suspiro se tornou soluços.

Era apenas uma pré-morte para aquele pré-amor que nunca existiu. Era apenas uma morte de tudo que ela havia passado. Aos poucos, novembro está passando, e com ele, ela também está passando. Passando fundo, deixando marcas de vazio e loucura. Mas quem se importa? Ninguém sabe. Ele, que havia se tornado um personagem qualquer, havia passado. Sem pensar em mais nada. Sem pensar nela, e em qualquer pessoa, ele foi embora.

Ela, sem pensar na solidão, na loucura, nos livros, e nas músicas de Lana Del Rey também se deu o direito de embora de tudo aquilo. Às vezes, você também tem o direito de ir embora, pensava ela. E foi exatamente isso que aconteceu. Foi claramente isso que aconteceu. A menina que já era feita e refeita milhares de vezes, foi embora de uma vez por todas daquela esquina, daquele álcool, e do corpo daquele menino.

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